Provence: um passeio de balão pelo interior e descobertas históricas em Avignon

Em suas charmosas cidades e comunas, a região do sul da França nos presenteia tanto com experiências nos ares quanto com programas culturais e gastronômicos mesclados - e com bons vinhos, claro

Daniela Filomenodo Viagem & Gastronomia

Provence, França

Após rodar algumas das mais admiráveis vilas, comunas e cidades do sul da França, entre pequenos territórios rurais e fortalezas que datam de longínquos séculos, afirmo que consegui, de fato, viver a Provence da maneira que imaginei: foram dias recheados de calmaria e por uma elegância única.

Vida ao ar livre, jardins cativantes, vislumbres de vilarejos medievais e uma mistura muito bem-vinda do espírito rural com a história fazem com que sintamos um joie de vivre, ou seja, uma alegria de viver.

Perfumes exalam pelas plantações – sejam de lavanda, verbena, trigo ou até de girassóis – e os pequenos produtores são os protagonistas destas terras.

Composta de várias cidades, gastronomia ímpar, paisagens e passeios deslumbrantes, digo que a Provence é mais do que um destino: é um sentimento, um estado de graça.

Sua riqueza rural é um convite tentador para bebermos um bom rosé (vinho característico do território), para nos depararmos com produtinhos locais e ainda para desacelerarmos.

Esse sentimento de interior nos lembra que a comunhão entre a terra e a história é um dos atributos mais especiais da região.

Pelas estradas da Provence

Após percorrer as peculiaridades que apenas Aix-en-Provence e comunas ao redor podem nos proporcionar, como visitar interessantes châteaux, pontos históricos, feiras livres e nos deixar contagiar pelo estilo de vida próprio, continuamos a viagem pela Provence.

Gravamos as atividades em volta da fábrica da L’Occitane em Manosque, uma das estrelas deste pedaço da França. Fomos ainda conhecer as plantações especiais de pequenos produtores e seguimos para comunas próximas.

Por alguns dias, Dauphin foi nossa base para conhecermos alguns dos pontos mais típicos daqui. A pequena comuna possui cerca de 10 km² e a vila principal se debruça sobre um cenário de colinas.

Aqui surge um adendo: a Provence como um todo é repleta de pontos, paradas, programas e atividades. É comum estarmos nas estradas e avenidas e nos depararmos com placas que sinalizam edifícios históricos, abadias e castelos, por exemplo.

Assim, o roteiro ainda contempla um passeio de balão pelos campos de lavanda e cidadelas históricas da Provence e ainda a parada em Avignon, onde, além de muita beleza, a história nos revela um passado ligado à Igreja e ao poder.

Sobre cidadelas e campos de lavanda: um passeio de balão

Uma coisa é certa: acordar cedo e dirigir em meio às plantações para realizar um passeio de balão nos campos da Provence é uma experiência única. Baseado na comuna de Forcalquier, próxima de Dauphin, o tour começa antes de estarmos no ar.

É bacana chegar no campo e fazer parte do processo, de tomar um cafezinho enquanto acompanhamos os balões encherem. O bom de se estar na França é isso: o café ao ar livre conta com bandejas de croissants e de pain au chocolat!

Uma vez dentro da cesta do balão, vamos subindo com delicadeza, e, às vezes, dois balões até se encostam, quase que se beijando. Lá em cima, é superespecial sobrevoar os campos de lavanda e apreciar o nascer do sol no horizonte.

Interessante é que, do alto, conseguimos ter uma noção melhor de como funcionavam as cidades fortificadas: ao passarmos por algumas delas vemos muralhas protegendo castelos em um formato circular. As cidades ficavam para fora, onde igrejas e casas de pedra as formavam. É lá de cima, muitas vezes, que entendemos como era estar lá embaixo.

Vale ressaltar que os voos de balão na Provence ocorrem apenas pela manhã, quando as condições climáticas são mais favoráveis. Sempre que um passeio sai como planejado, um drinque local é brindado junto dos baloeiros.

O passeio custa aproximadamente 205 € para os dias de semana e 229 € para os fins de semana com a empresa France Montgolfières, que também tem passeios espalhados por outros pontos do país.

Os encantos históricos e serenos de Avignon

Às margens do Rio Ródano e a 91 km de Aix-en-Provence, Avignon possui quase 100 mil habitantes e conserva suas muralhas de pedras medievais por todos os cantos. A cidade consegue ser ao mesmo tempo bela e rígida, pois carrega uma história marcada por guerras e disputas de poder.

Em passeio pelas ruelas da cidade, o empresário norte-americano Stephan Caso, que mora em Avignon há cerca de 20 anos, me deu um bom resumo. Pode-se dizer que a cidade tem duas histórias: a de hoje, com os lindos campos de lavanda ao redor, ruelas, cafés e monumentos, mas também a que envolve poder, já que foi a terra dos papas.

“Era um tempo de vida ou morte para a Igreja Católica quando os papas chegaram aqui. Era o tempo da Inquisição, tempos de violência. Mas hoje, quando você viaja pela Provence e por Avignon, tudo parece estar repleto de paz”, me diz Stephan.

A cidade foi residência dos papas católicos no século 14, entre os anos de 1309 e 1377, quando continuou sob domínio papal até se tornar parte da França em 1791. Andar sem compromisso pelas ruas daqui é se deparar com a história bem na nossa frente: muralhas e construções em pedras pesadas mostram força e preocupação com a segurança do passado.

Digo que Avignon é uma experiência diferente. A cidade mexeu mexeu comigo e parte disso foi por conta da minha estadia, já que optei por ficar num apartamento de aluguel no centro da cidade justamente para entender como se dava a vida ali.

Propriedade de Stephan Caso, o apartamento requintado fica no coração da cidade, bem próximo de um dos pontos mais conhecidos da Provence, o Palácio dos Papas.

Stephan desembarcou em Avignon em 1988 para um festival de teatro e se apaixonou perdidamente pela região. Em nosso passeio para entender um pouco mais a cidade, ele brincou com um sentimento fácil de sentir por aqui: “Sabemos quando chegamos em Avignon, mas não sabemos quando vamos sair. É perigoso!”.

Em meio a cafés, restaurantes e pontos turísticos, a vida sem pressa da região dá as caras e nos faz degustar Avignon com calma. Abaixo, listo alguns pontos da cidade que não podem deixar de estar no roteiro.

Palácio dos Papas e centro histórico

Um dos maiores monumentos do auge medieval da Igreja Católica Romana é o Palácio dos Papas, no sul da França. Palácio gótico, ele pode ser descrito como grandioso, já que são aproximadamente 15 mil m² de área construída repleta de vestígios do século 14.

No início do século 14, o papado foi levado pelo papa Clemente V até Avignon, que foi sede da Igreja Católica até 1377. Aqui, notamos que a espessura das paredes é bem grossa, o que reflete a preocupação com a segurança na época, pois o cenário era de instabilidade.

Tudo fazia parte de criar um ambiente que protegesse o papa, os tesouros da Igreja e que também mostrasse seu poder e sua força. Os tesouros, inclusive, têm uma ala própria dentro da fortificação, mas atenção: não há bens materiais opulentos por aqui. Na verdade, o que encontramos é a riqueza da construção, com suas ogivas góticas e a reverberação do passado.

Dentro da imponente edificação ainda testemunhamos a suíte do papal e áreas comuns monumentais. Um jardim inaugurado em 2020 é um dos toques mais recentes do local: ele mistura flores e plantas comestíveis, como a flor da alcachofra, que podemos ver aos montes aqui.

A entrada para o palácio custa a partir de 6,50 €. Junto do Palácio dos Papas, o Museu do Petit Palais e a Catedral românica de Notre-Dame-des-Doms completam o conjunto de monumentos que valem a visita e tiveram papel superimportante na história cristã na França.

O Centro Histórico de Avignon, inclusive, que ainda abrange a ponte Saint Bénézet, é Patrimônio da UNESCO.

Rocher des Doms e Ponte Saint Bénézet

O Rocher des Doms, rochedo na margem esquerda do Ródano, é o local por onde a cidade começou: é um local elevado em relação ao nível da margem do rio (cerca de 30 metros) e foi, em tempos passados, usado para fins de proteção.

O cume do rochedo é coberto por um agradável jardim público do século 19, o Jardin des Doms, erguido no estilo inglês. Em meio aos pontos turísticos, o jardim é boa oportunidade para uma pausa.

Pequenos lagos e árvores ficam junto de gramados, patos e cisnes. Piqueniques são autorizados e não é difícil ver crianças com sorvetes em dias quentes. O ideal aqui é deixar o tempo passar, sentar-se no café do parque e tomar uma taça de vinho. É sentir, degustar e se perder.

Do alto também conseguimos ver um dos cartões-postais de Avignon: a ponte Saint Bénézet. Sua idade impressiona: começou a ser construída em 1177, no século 12. Uma das curiosidades é que tinha 22 arcos, mas guerras e enchentes constantes fizeram com que fossem destruídos e sobrassem apenas quatro deles.

É possível andar sobre a parte remanescente da ponte, e pagamos 5 € pelo tíquete.

Paradinhas gastronômicas

É um fato conhecido que a cozinha da Provence é uma das melhores da França, e Avignon também desempenha um papel importante nesta história.

Por aqui, a dica é dar preferência ao que é de fato mais local e se “perder” entre os bistrôs, os pequenos restaurantes e cafés.

Restaurant Sevin

A poucos passos do Palácio dos Papas, o Sevin foi aberto há sete anos pelo chef Guilhem Sevin, que colocou à mesa criações culinárias modernas em torno de diferentes menus. O exterior da casa é coberto com plantas, e o terraço com vista para a praça é o melhor lugar para aproveitar o jantar.

Carnes, peixes e vegetais são servidos com plantas comestíveis da região, uma das características da gastronomia na Provence. O chef me conta que, todas as quintas, ele e a esposa saem pela cidade em caminhada pegando algumas flores pelos arredores.

“Na Provence temos jardins com todos os vegetais. Todas as comidas temos aqui. Estamos a uma hora do mar então é fácil termos peixes também”, me conta o chef.

Interessante notar que alguns dos pratos são inspirados nas decorações da cidade ao redor. “Técnica é a base do cozinhar, mas meu restaurante tem uma comida mais personalizada”, contextualiza Guilhem.

Os menus-degustação saem entre 45 € e 145 €.

10 Rue de Mons, 84000 Avignon, França

La Mirande

O La Mirande é um hotel cinco estrelas vizinho ao Palácio dos Papas. Seu interior guarda três restaurantes, bar e sala de chá. Com propostas que abrangem almoços e jantares a diferentes preços, a excelência aqui é levada a sério.

O Le Restaurant, restaurante principal do hotel, é dotado de uma estrela Michelin. Com decorações rústicas e provençais, o local é como um destino gastronômico e que serve de ponto de encontro.

Todas as tardes são servidas comidinhas gourmets na sala de chá, como doces caseiros, cheesecake branco, bolo de amêndoas e deliciosos croissants, servindo como uma pausa elegante num dos endereços mais emblemáticos da cidade.

4 Pl. de l’Amirande, 84000 Avignon, França

Maison Brémond – 1830

Com vontade de voltar com algumas delicinhas da Provence na mala? A Maison Brémond é uma paradinha certa em Avignon. Tradicional loja da cidade, a família Brémond começou o negócio na verdade na Cours Mirabeau em Aix-en-Provence em 1830.

Na época era líder no comércio de amêndoas, especiarias, azeites e trufas, além de fabricantes de doces. Hoje podemos encontrar tudo isso e outros produtos nas prateleiras da simpática loja.

34 Rue de la Grande Fusterie, 84000 Avignon, França

Chateau Saint Nabor (em Cornillon)

Daniela Filomeno na adega do Chateau Saint Nabor, que produz vinhos tintos, brancos e rosés / CNN Viagem & Gastronomia

A viagem não ficaria completa se não parássemos para dar uma conferida numa tradicional vinícola próxima e, de quebra, experimentar alguns dos melhores vinhos da casa. O Chateau Saint Nabor fica na pequena comuna de Cornillon, que não fica na Provence, mas sim na Occitânia.

Os vinhos do chateau pertencem à área histórica de Languedoc, um tradicional território produtor de vinhos. Apesar disso, a vinícola e seus produtos estão mais próximos culturalmente da Provence, como me explica Jérémie Castor, proprietário do chateau. 

Aqui são vários tipos de terroir, inclusive na propriedade, em que é a sexta geração da família que está à frente dos negócios. Logo quando chegamos notamos de cara que é uma vinícola familiar, dado também os cuidados com a propriedade. Ao entrarmos na casa principal entramos na verdade em um prédio do século 11, que funcionava como uma antiga igreja.

É especial estar aqui, muito mais ao lado de Jérémie, para não apenas conhecemos e degustarmos vinhos, mas também apreciarmos toda a história.

Vinhos tintos, rosés e brancos são produzidos pela vinícola e é interessante notar que a região do Vale do Rhône tem mais de 73 mil hectares de vinhedos, sendo a segunda maior região vinícola em extensão da França – ficando atrás apenas de Bordeaux.

Por aqui, paredes e abóbadas de pedra sobreviveram aos séculos e hoje nos recebem para provarmos os vinhos da casa na adega. A visita é aberta e deve ser agendada para grupos, assim como o tour pela propriedade.

Chateau Saint Nabor; Vignobles St Nabor, Route de Barjac, 30630 Cornillon, França