Referência em arte popular brasileira, Museu do Pontal inaugura nova sede no Rio

Com mais de nove mil obras de 300 artistas, museu troca de endereço e estreia em terreno de 14 mil m² na Barra da Tijuca

Fachada no Museu do Pontal, que apresenta maior e mais importante acervo sobre a arte popular brasileira
Fachada no Museu do Pontal, que apresenta maior e mais importante acervo sobre a arte popular brasileira Divulgação

Tina Binido Viagem & Gastronomia

No próximo 9 de outubro, o Museu do Pontal, referência internacional em arte popular brasileira, se instala em nova endereço no Rio: se despede da Estrada do Pontal – Recreio dos Bandeirantes para fixar suas mais de nove mil obras, de 300 artistas, na Barra da Tijuca. Seu acervo é considerado o maior do gênero e de relevância reconhecida pela Unesco. O local escolhido tem uma espaço de 14 mil m², sendo 10 mil de área verde, com paisagismo assinado pelo Escritório Burle Marx, onde estão plantadas dezenas de milhares de mudas de 73 espécies nativas brasileiras.

O edifício de 2.600 m² de área construída, projetado dentro do conceito de sustentabilidade, está assentado sobre um enorme terreno consolidado e livre de inundações – problema enfrentado no antigo local – dando segurança ao raro e singular acervo, e com vista aberta para parte do conjunto de montanhas conhecido como Gigante Adormecido, que vai da Pedra da Gávea ao Pão de Açúcar.

Com paisagismo assinado pelo Escritório Burle Marx, Museu do Pontal tem dezenas de milhares de mudas de 73 espécies nativas brasileiras (Foto: Uirá Fornaciari)

Exposições Inaugurais

O conjunto das exposições inaugurais se chama “Novos ares: Pontal reinventado”, marcando este importante momento na história do Museu. São seis exposições, uma de longa duração, e cinco temporárias, que reúnem 700 conjuntos de obras, com um total de cerca de duas mil peças. O Museu do Pontal terá um café/restaurante, uma loja, e uma extensa programação para todos os públicos.

Gilberto Gil, Dona Isabel, Ailton Krenak e José Saramago

Em meio às exposições, o público verá a riqueza da arte popular através de vídeos e textos poéticos, e em depoimentos de personalidades como Gilberto Gil, Dona Isabel, Ailton Krenak e José Saramago. “Novos ares: Pontal reinventado” abrange obras do acervo do Museu e de importantes coleções convidadas. A exposição de longa duração faz uma homenagem à proposta original de apresentação das obras do Museu do Pontal criada por seu idealizador e fundador, Jacques Van de Beuque (1922-2000), que estabeleceu uma maneira própria e inovadora para apresentar o Brasil profundo revelado por seus artistas populares. Esta concepção foi revisitada à luz de 2021, com uma nova compreensão dos ciclos criados por ele, que apontavam as transformações do Brasil com a migração da área rural para a cidade.

Exposições temporárias

Em torno da exposição central estarão cinco outras exposições temporárias, focadas na diversidade da produção artística do país, com esculturas que dialogam com temas fortes da cultura brasileira, a partir dos olhares originais de seus autores.

1. Brincares – Brincadeiras e brincantes
Obras interativas e cinéticas como “Circo”, de Adalton Fernandes Lopes (Niterói, 1938 – 2005), e os brinquedos de madeira de Antonio de Oliveira (Minas Gerais, 1912-1996). O local terá uma arquibancada lúdica, apropriada para estimular a curiosidade das crianças, com provocações e instigações.

2. Terra/Terra – O Jequitinhonha e suas tradições
Neste espaço, o destaque são os artistas, em especial Noemisa Batista (1947), Dona Isabel Mendes da Cunha (1924-2014) e Ulisses Pereira Chaves (1929-2006). Em outro nível de leitura, provoca o público a pensar sobre o significado do termo tradição, em tempos de tantas e aceleradas mudanças.

3. Entre beiras e margens – Fogo, água, ar
Artistas do Alto do Moura, Pernambuco, como Mestre Vitalino (1909-1963), mostram em suas antológicas esculturas em barro a importância do fogo na feitura da cerâmica. Barcos trazem a energia primordial das águas do mar e do Rio São Francisco, com as carrancas de MestreGuarany (1884-1985). Outros seres mitológicos, como as sereias e os barcos de presente a Oxum, estão nas obras de Zezinho de Arapiraca, Selvino (1941) e Tamba (1934-1987), da Bahia. Nhô Caboclo (1940), de São Paulo, e Laurentino (1937), do Paraná, com suas obras eólicas, que aludem à energia dos ventos.

4. Poética da criação
Artistas cujas obras escapam às primeiras apreensões, fugindo aos temas consagrados historicamente na arte popular, reúnem-se nesse setor. São seres fabulosos, personagens fantásticas, criações ímpares. Neste espaço, há um diálogo maior entre as obras reunidas por Jacques Van de Beuque no Museu do Pontal e outras coleções convidadas, criadas tanto por indivíduos apaixonados por arte popular, como por acervos vindos de importantes instituições brasileiras, como SESC-SP e Itaú Cultural.

5. Devoções
Em uma leitura livre e abrangente, esse setor apresenta a diversidade de expressões da fé, e os artistas vinculados às devoções populares, incluindo sua dimensão festiva. Os destaques, além dos ex-votos, são os artistas Otávio, e seus orixás, Mestre Didi (1917), da Bahia, e sua estética afro-brasileira, e Zé do Carmo (1934), de Pernambuco, com seus anjos negros. Uma sala especial reúne presépios – a um depoimento sensível de Caetano Veloso, sobre suas memórias de Natal. No trajeto, um encontro com as grandes engenhocas cinéticas de Adalton Lopes (1938-2005), de Niterói: a “Vida de Cristo” e o “Carnaval no Sambódromo”.

Breve Histórico

O Museu Casa do Pontal, criado em 1976 pelo artista e designer francês Jacques Van de Beuque, ganhou este nome por conta de sua localização, em um terreno de cinco mil metros quadrados na região conhecida como Pontal, no Recreio dos Bandeirantes, parte final da extensa orla da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Ainda em 1976, Jacques apresentou, no Museu de Arte Moderna do Rio, a exposição “A arte do viver e do fazer”, com as obras que havia reunido nas várias viagens realizadas pelo país, desde a década de 1950, em sua pesquisa que deu a devida visibilidade, no Brasil e no exterior, à produção de artistas de localidades pobres e distantes dos centros econômicos do país, revelando o que se passou a chamar de arte popular.

Em 1995, o filósofo, matemático e cineasta Guy Van de Beuque (1951-2004), filho de Jacques, passou a dirigir o Museu do Pontal, ampliando sua área expositiva e criando uma interface digital, o portal na internet. Com a morte prematura de Guy, o Museu do Pontal passou a ser dirigido pela antropóloga e cineasta Angela Mascelani, viúva de Guy, que desde 1996 fazia a direção de pesquisa e comunicação do Museu. Angela Mascelani deu continuidade às pesquisas e aquisições de obras e é responsável pela curadoria de dezenas de exposições sobre o acervo do Museu.

A partir de 2010, Angela Mascelani passa a dividir a gestão do Museu do Pontal com seu filho Lucas Van de Beuque, economista e fotógrafo, com longa atuação em gestão cultural, e neto de Jacques Van de Beuque.

Instituição com relevância reconhecida pela Unesco, o Museu Casa do Pontal já foi visitado por mais de 2 milhões de pessoas, e já realizou 70 exposições parciais do acervo no Brasil e em mais 15 países.

Museu do Pontal
Av. Celia Ribeiro da Silva Mendes, 3.300, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, CEP: 22790-711
Quinta a domingo, das 9h30 às 18h
Entrada gratuita, com contribuição voluntária