Feijoada, moqueca, baião de dois: como harmonizar vinhos com comida brasileira

Esqueça a caipirinha ou a cerveja gelada. Aqui estão dicas para combinar diversos pratos da nossa culinária com tintos, brancos e até espumantes

Baião de dois, um dos pratos que é a cara do Brasil harmoniza com vinhos tintos portugueses e ainda do Vale do São Francisco (Foto: divulgação)

Por Marjorie Zoppei* 

É verdade que a bebida fermentada de uva começou a frequentar as mesas cotidianas do brasileiro há pouco tempo. Por isso, é comum pensar em cerveja ou caipirinha quando falamos do trivial arroz com feijão ou de clássicos como feijoada e picadinho.

Um dos principais objetivos da harmonização é fazer com que o encaixe entre comida e vinho consiga valorizar ambos os lados. Incluir o vinho na refeição brasileira pode parecer desafiador, mas existem alguns fatores que precisam ser levados em conta.

Para o prato, pense na proteína, nos temperos, na concentração de sal e de gordura, na acidez e no amargor. Cada um desses itens (ou aquele que prevalecer) deve casar com as características do vinho: acidez, teor alcoólico, intensidade do corpo, taninos e doçura. Com todas essas informações em mãos, é como montar um quebra-cabeça. Veja algumas dicas:

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Feijoada

Feijoada
(Foto: divulgação)
Casa Venturini Tannat
Casa Venturini Tannat (Foto: divulgação)

Além de ter muitos elementos, o prato também inclui diversos acompanhamentos, como arroz, farofa, couve, vinagrete, etc. Aqui, existem duas alternativas. A primeira é seguir a regra da união por contraste: por ser um alimento gorduroso e com notas defumadas, combina com um espumante encorpado e de acidez elevada. A outra é seguir com um tinto de corpo com média intensidade e boa estrutura tânica, como os vinhos elaborados com a uva tannat.

Eu fico com a segunda opção, como o Casa Venturini Tannat Reserva 2017. Os uruguaios são craques em valorizar o potencial da uva tannat, mas a região da Campanha Gaúcha se mostrou um terroir com muitas virtudes que se espelham ao território vizinho.

Moqueca baiana de camarão

Moqueca de Camarao
(Foto: divulgação)
GUASPARI chardonnay 2018
Guaspari Chardonnay 2018 (Foto: divulgação)

O crustáceo tem sabor leve e delicado. Adicione ao preparo o azeite de dendê e o leite de coco. Para que todos esses sabores sejam ressaltados, aposte em um branco da uva chardonnay, mas que tenha passado por barricas para ganhar peso e untuosidade.

A sugestão é o paulista Guaspari Chardonnay Vista do Lago 2018, da cidade do Espírito Santo do Pinhal, que foi fermentado em barris de carvalho e estagiou sobre as borras finas (partículas da uva e leveduras) por 14 meses. Isso rendeu complexidade à bebida, mas a manteve fresca, com aromas de frutas cítricas e brancas, além de um final de boca bastante persistente. Agora, a decisão de incluir o coentro na receita fica por sua conta!

Baião de dois

Alicante bouschet gran reserva
Rio Sol Alicante bouschet (Foto: divulgação)

É a cara do Brasil: uma mistura de arroz e feijão, enriquecido com bacon, linguiça, carne seca, queijo coalho, alho, cebola, tomate e ervas frescas. Contém muito sabor e boa dose de gordura. Portanto, pode pensar em casar com um tinto com certo toque rústico, bom teor alcoólico e leve toque de madeira, como são os vinhos portugueses do Alentejo ou do Dão.

Mas já que estamos falando de um prato nordestino, por que não fazer uma combinação regional? O Rio Sol Gran Reserva Alicante Bouschet é produzido no Vale do São Francisco, na cidade de Lagoa Grande, em Pernambuco. Imponente, marcante e elegante, passou por nove meses em barrica carvalho francês e tem 13% de álcool. Uma das maiores surpresas do ano.

Picadinho

Picadinho
(Foto: divulgação)
Pedras pinot noir
Pedras Altas Pinot Noir (Foto: Pedras Altas)

O nome do prato já rima com vinho: embora tenha sido difundido nos botecos de São Paulo e do Rio de Janeiro, hoje o picadinho tem uma roupagem mais elaborada, feito a partir de carnes nobres, como filé mignon e alcatra, e caramelizado com um caldo aveludado que também leva vinho no preparo.

Na harmonização, o tinto é o único candidato, mas ele deve ser simples para não roubar a cena. Prove com o Pedras Altas Pinot Noir 2018, elaborado na Serra do Sudeste, no Rio Grande do Sul. Esse vinho tem mais estrutura que um pinot noir comum, mas com estilo que remete a exemplares da Borgonha.

Frango com Quiabo

Frango com quiabo
(Foto: divulgação)

De raiz mineira, talvez seja o mais complexo de combinar com vinho. Embora o frango seja uma carne leve, é preciso levar em consideração o tempero picante e o leve amargor do quiabo. A mistura vai bem com um branco da uva gewürztraminer, que tem bom volume de produção na Campanha Gaúcha.

Espumante Garibaldi Moscatel
Moscatel Garibaldi (Foto: divulgação)

Outra opção é um syrah feito na Serra da Mantiqueira, que tem boa acidez e pouco tanino. Para fugir do óbvio, eu fico com um espumante moscatel, como Garibaldi Moscatel, da Serra Gaúcha. Esta junção contrasta a doçura da bebida com a intensidade de sabores da comida. E as borbulhas dão o toque festivo à refeição!

*Sobre Marjorie

Marjorie Zoppei, jornalista e amante de descobrir os melhores vinhos ao redor do mundo (Foto: divulgação)

Escolheu o jornalismo ainda na adolescência, mas foi apresentada à gastronomia por acaso. Com passagem pela Editora Abril e Folha de S.Paulo, atualmente é diretora de redação da revista Sociedade da Mesa, publicação do clube de vinhos pioneiro no Brasil. É daquelas pessoas que têm sempre uma taça em mãos e disposição para descobrir o que está por vir. Siga em @mzoppei, no Instagram.