Cachaça: a história por trás da bebida favorita do Brasil

Diferente da maioria dos tipos de rum, não é feita de melaço, mas de caldo de cana fresco, que é fermentado e destilado.

Lucy Sheriff

Da CNN

 

Produção artesanal de cachaça no interior de SP
Produção artesanal de cachaça no interior de SP
Foto: CNN

O México tem a tequila. A Colômbia tem a aguardente. Cuba tem rum. A bebida do Brasil? Atende pelo nome de cachaça. A bebida começou a ser feita por escravos em engenhos de cana no começo dos anos 1500, pouco depois de os portugueses introduzirem a cana de açúcar no país.

Outrora um item importante para trabalhadores de baixa renda, a bebida inicialmente era conhecida como “pinga”, antes de se tornar mais conhecida pelo nome de cachaça.

Agora, é o ingrediente chave de caipirinhas, sendo vendida no exterior por preços comparáveis aos do uísque.

“Vinte anos atrás, vendíamos para pessoas que vinham à nossa destilaria a cavalo ou de carroça”, lembra Pedro Eduardo Valente, que trabalha na destilaria da Fazenda Planalto, propriedade da sua família há gerações.

“Carregavam cinco ou seis jarros. Nossa cachaça dominou a região e as pessoas não queriam nenhuma outra marca.”

A fazenda de Valente fica nos arredores de Brotas, no estado de São Paulo, conhecida por sua produção de cachaça.

Embora produtores da bebida possam ser encontrados na maior parte do Brasil de hoje – o último levantamento em 2011 chegou ao número de 40.000 – Pedro se orgulha da operação de sua fazenda de família, que ele administra com seu filho Carlos.

Para a família Valente, é tudo uma questão de tradição. Pedro aprendeu o ofício de destilar cachaça com seu pai e o passou a Carlos, que espera que seu próprio filho continue a tradição.

Um negócio de família

Como o rum, a cachaça tem duas variedades: não envelhecida, conhecida como “branca” ou “prata”, e envelhecida, conhecida como “amarela” ou “ouro”.  A primeira geralmente é engarrafada imediatamente após a destilação e, como resultado, tende a ser mais barata.

A Fazenda Planalto, entretanto, se concentra na variedade envelhecida e vem usando o mesmo processo de fermentação e destilação há mais de um século.

“A tradição da cachaça é do estado de São Paulo – acho que muito dela veio da nossa família”, diz Carlos. Seu bisavô chegou ao Brasil vindo da Itália em 1888 e foi um dos primeiros produtores de cachaça.

“Ensinamos um monte de gente a fazer cachaça”, diz ele. “Muitas pessoas aprenderam conosco porque na época não havia nenhuma destilaria na região. A nossa foi a primeira, fomos pioneiros.”

A cachaça feita aqui é envelhecida de um a cinco anos em barris grandes de madeira, que estão na família há nove décadas.

Os barris não transmitem qualquer sabor, explica Carlos, por serem muito velhos, então a bebida pode descansar sem que seu gosto seja alterado. Mas os barris amenizam a acidez da cachaça, diz Pedro.

“Para quem gosta de uma boa cachaça, você tem que usar barris envelhecidos para que eles não deixem passar o sabor da madeira”, diz Carlos.

Atualmente, os Valente usam uma máquina de engarrafar caseira e fazem as etiquetas à mão. Mas estão modernizando a destilaria e esperando a entrega de uma nova máquina etiquetadora, que imprimirá etiquetas novas, com um novo design, que eles usarão para vender sua bebida no exterior.

A etiqueta será mais moderna, diz Carlos, “com a história da nossa cachaça, explicando como é feita.”

Cachaça de boa qualidade pode ser apreciada pura, mas a bebida é geralmente usada para fazer caipirinhas.

Dose ou drink?

Feita com limão socado com açúcar, gelo triturado e cachaça e servida em um copo baixo, a caipirinha pode ser encontrada praticamente no mundo todo.

Carlos, no entanto, gosta de se ater à tradição. “Para as gerações mais velhas, como meu pai, é um gole antes do almoço, um gole antes do jantar, para abrir o apetite”.

“Sem limão, sem açúcar, em outras palavras, nada de caipirinha para saboreá-la. Não digo que não seja boa na caipirinha… com nossos tradicionais limões galegos, é uma caipirinha excelente. Mas a essência da cachaça é tomá-la pura.”

De acordo com números de 2015, aproximadamente 1,8 bilhão de litros foram produzidos em apenas um ano, sendo 15 milhões destes exportados para o mundo inteiro.

Estima-se que a maioria dos produtores é de destilarias informais.

Em 2012, a empresa de bebidas Diageo, do Reino Unido, comprou a Ypióca, terceiro maior produtor do país, baseado no estado do Ceará, com a esperança de levar a bebida para o mundo todo.

As exportações em 2016 somaram aproximadamente 8,7 milhões de litros, comparadas aos 196 milhões de litros de tequila do México no mesmo ano.

Apesar das ambições da Diageo, a indústria de exportação de bebidas permanece dominada pela cerveja. Portanto, os consumidores estrangeiros devem ter que esperar um pouco mais para que a cachaça se torne tão disponível quanto a tequila.

Neste meio tempo, os brasileiros vão continuar a apreciar a bebida essencial de seu país. Nem sempre foi uma bebida para todos, mas ganhou muita popularidade nos últimos 20 anos, mais ou menos, conta Carlos.

“Hoje, todos os brasileiros gostam de cachaça”, diz. “Ela conquistou o seu lugar.”