A pacata Sifnos, um tesouro grego escondido no mar Egeu

Vizinha de Mykonos e Santorini, essa pequena ilha na Grécia é rota alternativa para o turista que quer fugir da badalação, mas que está em busca de belas praias, culinária saborosa e muita história

Para que busca sossego e tranquilidade está a praia de Herronisos, em Sifnos - até sinal de celular não chega ali
Para que busca sossego e tranquilidade está a praia de Herronisos, em Sifnos - até sinal de celular não chega ali Alex Coelho/Divuulgação

Rodrigo Zanetticolaboração para o Viagem & Gastronomia

Em 1961, quando o francês Henri Cartier-Bresson visitou a ilha de Sifnos, na Grécia, e fotografou uma de suas mais famosas paisagens, talvez não imaginasse que estaria divulgando para o mundo uma joia rara no arquipélago das Cíclades, ou como muitos costumam chamar esse conjunto de ilhas banhadas pelo mar Egeu, o Caribe da Europa.

Habitada desde a Idade do Bronze (cerca de 3.000 a.C.), Sifnos era popular no comércio da antiguidade devido as suas minas de ouro e prata e, apesar de passar a impressão de que é pequena, para os padrões locais é considerada uma ilha de tamanho mediano com 73 quilômetros quadrados de extensão e cerca de 2.600 habitantes.

Mas o que chama ainda mais atenção não é só a riqueza das suas terras e a paisagem exuberante, e sim a tranquilidade dessa ilha, fator que a maioria da sua população se esforça para manter.

Para os moradores locais é um dever conservar a paz e, em muitos casos, recorrer ao passado para se adaptar aos desafios do futuro.

Talvez seja por esse motivo que Sifnos tem se mostrado a cada ano uma rota alternativa para o turista que quer fugir da badalação, mas não abre mão de belas praias, comida saborosa e o típico cenário de uma ilha grega com casas de teto branco, igrejas no alto das montanhas e vielas estreitas, sempre abarrotadas de flores coloridas.

Kamares, a porta de entrada

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Kamares é uma das portas de entrada para Sifnos/ Alex Coelho/Divulgação

Durante o verão europeu é comum ver o porto de Kamares – que também dá o nome à pequena vila de pescadores e artesãos -, cheio de turistas, porém nada comparado a quantidade de visitantes que passam pelas duas ilhas vizinhas mais famosas das Cíclades, Mykonos e Santorini.

O porto, que recebe ferries vindos de Piraeus, em Athenas (cerca de 130 km de distância), e de outras ilhas ao redor de Sifnos, é razoavelmente pequeno e fica apertado na alta temporada quando os barcos chegam, mas muitos moradores preferem assim e, inclusive, se posicionam contra um projeto de expansão. Tudo para tentar preservar as características do local.

Kamares, que conta ainda com uma praia de água cristalina e calma – muito popular entre as famílias, principalmente com crianças – tem pequenos hotéis, pousadas, bares, cafés, tavernas, lojas de souvenirs, de aluguel de carro e cerâmicas.

Isso mesmo, Sifnos é famosa por suas louças e outros objetos feitos com um tipo especial de argila bastante abundante na região.

A arte da cerâmica Sifnian

Sifnos também se destacou na Grécia antiga como grande produtora de cerâmicas devido ao rico solo da ilha. Alguns potes encontrados em escavações feitas em Kastro, a antiga capital, mostram que as peças foram produzidas entre o período Geométrico (900 – 750 a.C) e Helenístico (338 – 146 a.C).

Durante o auge da produção, havia uma divisão de trabalho nas oficinas para otimizar a cadeia produtiva. Os “kladas” eram responsáveis por recolher a lenha que abastecia os fornos das fábricas, enquanto os “homatas” extraiam o barro que seria usado na confecção das peças.

Já os “moularas” transportavam a matéria-prima em mulas para as oficinas e entregavam para os “kopanistis”, que preparavam a argila. No final, o composto era entregue para o “basperitis”, ou seja, o artesão que criava as peças.

Essa tradição, que passou de geração para geração e hoje corre o risco de desaparecer devido ao não interesse dos jovens, foi simplificada mas continua fazendo parte da economia e cultura local.

Porém, com o advento da globalização, as fábricas artesanais diversificaram suas fontes de renda e oferecem até workshops de cerâmica. A “Atsonios Handmade Ceramics”, que foi fundada em 1870 em Vathi, é uma boa pedida para quem se aventurar nessa área.

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Flaros são cerâmicas colocadas na ponta da chaminé/ Alex Coelho/Divulgação

Além de utensílios de cozinha como panelas de barro, louças, canecas etc, os artesãos também produzem manualmente os “flaros”, uma espécie de acabamento para colocar na ponta da chaminé das casas.

Gastronomia à moda antiga

As panelas de barro produzidas na ilha geralmente têm um destino certo, pois a maioria das cerâmicas de Sifnos foram desenvolvidas para caminhar junto com a culinária local.

Um exemplo disso é a “revithada”, uma sopa de grão-de-bico que é cozida por muitas horas em forno a lenha em uma cerâmica chamada “skepastaria”, própria para a preparação desse prato. A sopa é a principal atração do almoço dos domingos.

Nessa mesma linha também é preparado o “mastelo”, que nada mais é do que a carne do cordeiro ou cabrito cozida em uma panela de barro – de nome homônimo ao prato – com vinho e dill (endro).

Essa iguaria, que também passa horas no forno a lenha, é tradicional na Páscoa. No entanto, o turista encontra o prato com facilidade nos restaurantes em outras épocas do ano, como por exemplo no Isalos, na praia de Karames, próximo ao porto.

gastronomia Sifnos
Revitada, uma sopa de grão-de-bico por muitas horas em forno a lenha/ Alex Coelho/Divulgação

Para os amantes de queijos, a atração principal é o Manoura de Sifnos, que pode ser feito com o leite de cabra ou ovelha – dois animais predominantes na fauna local.

Esse queijo é encontrado em duas versões: uma cremosa, que é usada nas saladas junto com azeitonas, alcaparras, azeite e mel – ingredientes também tradicionais na região – ou maturada, quando ele é condimentado com ervas, sal e vinho.

Peixes e frutos do mar completam o cardápio variado da ilha, com destaque para o dourado assado – típico na maioria dos bares e restaurantes de praia – e os mariscos.

Já as sobremesas mais comuns são melopita, uma espécie de torta de mel com queijo, o rizogalo, muito semelhante a um arroz-doce, o koulouri, que nada mais é que um biscoito crocante com gergelim, e a loli sfnou, uma torta de abóbora com mel, laranja e baunilha.

Salada com queijo Manoura de Sifnos, que pode ser feito com o leite de cabra ou ovelha/ Alex Coelho/Divulgação

Sifnos também faz questão de relembrar a trajetória de seu ilustre filho, o chef e escritor grego Nicolau Tselementes (1878 – 1958), autor de livros de culinária e o primeiro a exportar para o mundo as receitas gregas.

Todos os anos, no início de setembro, o Festival Gastronômico das Cíclades Nicolau Tselementes reúne representantes de diversas ilhas da região em Sifnos. Eles expõem para o público o melhor da sua culinária, incluindo apresentações musicais e de dança.

Agricultura orgânica e sem o uso da água

Sifnos também produz uma pequena parte dos vegetais que são consumidos no comércio local, porém, devido a escassez das chuvas e as altas temperaturas, alguns produtores foram forçados a adaptar suas plantações.

Um exemplo disso é a fazenda orgânica Narlis, que existe desde 1925 e por três gerações vem adaptando sementes de frutas e verduras de forma natural para serem cultivadas sem água.

George Narlis, proprietário do local, disse que sua família precisou encontrar novas formas de cultivar a lavoura sem o uso da água porque o rio que passava pela propriedade – e que também atravessava toda a ilha – secou há muitos anos deixando os agricultores reféns da pouca água das chuvas.

Na fazenda é comum encontrar melancias pesando 10Kg que não receberam nenhuma gota de água para se desenvolverem. O mesmo acontece com melões, peras, abóboras, tomates, batatas entre outras frutas e vegetais.

Talvez a maior vantagem dessa produção além da economia da água é o sabor dos alimentos que é indescritível.

Vilas, praias e passeios para todos os gostos

A capital de Sifnos é a charmosa vila de Apollonia, localizada no centro da ilha. Seu nome deriva da adoração ao deus Apolo, um dos deuses gregos representados como a divindade solar.

É em Apollonia que se concentram a maior parte dos serviços como bancos, padarias, mercados, farmácias e um pequeno posto médico para emergências.

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Apollonia é uma das principais vilas, mais bem conectada com o resto da ilha/ Alex Coelho/Divulgação

A capital da ilha também tem pequenos restaurantes, bares, central de turismo, hotéis e pousadas. O Museu do Folclore de Sifnos, que fica na praça central, e as vielas repletas de lojas são as principais atrações.

Apollonia talvez seja o melhor local para se hospedar para quem prefere não alugar carro, pois é bem conectada aos ônibus que cobrem toda a ilha.

A cerca de 20 minutos a pé de Apollonia fica Artemonas, a segunda maior vila da ilha, que recebeu esse nome por se acreditar que no local onde hoje fica a igreja de Panagia Kokhi era templo da deusa Artemis, irmã de Apolo.

Artemonas também foi o símbolo da aristocracia e da prosperidade econômica da ilha no século passado, pois até hoje pode ser visto algumas casas neoclássicas suntuosas com jardins repletos de flores.

Sifnos
Kastro foi escolhida para a ser a primeira capital da ilha por conta da sua posição geográfica no topo de uma montanha/ Alex Coelho/Divulgação

Na região conhecida como Bella Vista (Kallithea, em grego), se encontram dois moinhos de vento que fazem parte do cartão-postal da ilha.

Não muito longe dali fica a vila de Kastro, nome que deriva da palavra castelo.

Kastro foi escolhida para a ser a primeira capital da ilha por conta da sua posição geográfica no topo de uma montanha e por isso logo se transformou num vilarejo medieval cercado por muralhas.

Fica em Kastro o Museu Arqueológico de Sifnos e uma das igrejas mais fotografadas da ilha, a Epta Martyres.

O vilarejo talvez seja o mais charmoso de Sifnos, com suas vielas estreitas, cobertas por mármore e repletas de flores coloridas, o cenário perfeito para quem procura uma foto inesquecível de uma tradicional vila grega.

Para os amantes de praia com areia branca, água morna e cristalina Vathi, a 10 km a oeste da capital Apollonia, é uma excelente opção.

O vilarejo era formado apenas por pequenos produtores de cerâmica até a Segunda Guerra Mundial, mas se rendeu ao turismo depois da abertura das estradas e da chegada da energia elétrica no local. Hoje em dia conta com diversas pousadas, bares e restaurantes.

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Vathi: praia com areia branquinha e com uma estrutura para os turistas/ Alex Coelho/Divulgação

Vathi possui a maior praia da ilha, sítios arqueológicos numa área conhecida como Punta tou Polemikou e trilhas ecológicas.

Não longe dali se encontra Platis Gialos, outra praia muito popular entre os turistas. Dali se pode ver a pequena ilha de Kitriani, que é inabitada e pertence a Sifnos. Lá existe apenas uma igreja chamada Panagia Kitriani que acredita ser a mais velha de Sifnos, construída entre os séculos 10 e 11.

Mas para quem procura sossego e tranquilidade a praia de Herronisos é o lugar perfeito – até sinal de celular não chega ali.

Herronisos é uma antiga vila de pescadores que conta com apenas duas tavernas, um pequeno mercado e alguns quartos para aluguel. A estrada para chegar nessa praia é cheia de curvas, mas a paisagem vale cada minuto. A dica aqui é levar comida, bebida e muito protetor solar.

Igrejas e Monastérios

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Ao longe, o mosteiro Panagia Chrysopigi, que foi construído em 1650/ Alex Coelho/Divulgação

O mosteiro de Panagia Chrysopigi, construído em 1650, é sem dúvida o mais visitado da ilha e fica sobre uma península que se separou do continente.

De acordo com a lenda, um milagre teria ocorrido no local quando as mulheres de Sifnos tentavam se refugiar de piratas que atacavam a ilha. A rocha então se rompeu e os invasores acabaram morrendo afogados.

O mosteiro é muito usado para batizados e casamentos, além de celebrações como a as tradicionais “panagiri”, festas religiosas com comida, música e danças.

Já no ponto mais alto da ilha fica o Monastério do Profeta Elias Apsilou, que foi construído no local de uma antiga acrópole. Ao lado direito do Monastério fica a capela de Agios Elisaiou.

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Igreja dos Sete Martirs, em Sifnos, Grécia/ Alex Coelho/Divulgação

Mas para quem procura uma igreja pequena, porém com uma vista espetacular do alto da montanha e com um belo pôr do sol, Agios Simeon é o local perfeito. A estrada para chegar até essa capela é íngreme, estreita e cheia de curvas, mas a paisagem compensa o trajeto.

Ao todo, Sifnos conta com 237 igrejas espalhadas por toda a ilha.

Como chegar em Sifnos

Os visitantes internacionais devem usar o aeroporto internacional de Athenas, Mykonos ou Santorini e se deslocar até Sifnos com ferries.

A viagem do porto de Piraeus, em Athenas, em um ferry convencional pode durar entre 5 e 6 horas, enquanto o de alta velocidade dura de 2 e 3 horas.

Sifnos também conta com um heliporto em Tholos, no norte da ilha.