Fazenda no Rio de Janeiro une viagem ao passado do café à produção orgânica do presente

No Vale do Café, Fazenda Alliança recebe com aconchego e resgata seu potencial produtivo - mas desta vez colocando em prática importantes princípios agroecológicos

CNN Viagem e Gastronomia

Daniela Filomenodo Viagem & Gastronomia

O engenho de beneficiamento, a tulha e o grande terreiro de pedra logo em frente ao casarão principal revelam que a Fazenda Alliança é intimamente ligada à produção cafeeira. Uso o tempo verbal no presente pois a história se repete: mais de um século depois dos tempos áureos do café, na segunda metade do século 19, a fazenda resgatou suas origens e estabeleceu-se novamente como uma propriedade produtiva, agora certificada e orgânica no século 21.

Localizada em Barra do Piraí, uma das 15 cidades que fazem parte do Vale do Café, no sul do estado do Rio de Janeiro, a fazenda histórica data de 1863 e chegou a pertencer ao 3º Barão de Rio Bonito. 158 anos depois, a Alliança pode ser vista como uma aula de história e agroecologia: o sistema original de transporte e separação dos grãos, que inclui o terreiro de secagem e a tulha de armazenamento, continua preservado enquanto o local torna-se uma referência na produção orgânica.

terreiro fazenda allianca
Varanda do casarão em frente ao grande terreiro da fazenda. Detalhes das palmeiras imperiais ao fundo (Foto: Daniela Filomeno)

Passando por vários donos ao longo do tempo, a fazenda foi adquirida em 2007 por Josefina Durini, que restaurou o local e implantou uma produção sustentável de leite orgânico de búfala, café especial, horta e pomares orgânicos. De origem argentina, ela chegou a comandar uma galeria de arte em Londres, em que sua personalidade é refletida na decoração: a arquitetura neoclássica e os objetos do casarão de 1863 mesclam móveis de jacarandá com peças da China, Vietnã, Tailândia e Marrocos.

Foi a partir de 2018 que Bruno e Irene Donati, amigos de Josefina e casal anfitrião que recebe os visitantes com ópera e de maneira alegre e superdivertida, “convenceu” a dona a abrir as portas para hóspedes além de seus amigos. Os apenas oito quartos da casa – sete suítes duplas e uma simples – são destinados a grupos fechados de até 15 pessoas, que podem experimentar uma hospedagem mais personalizada. Os aposentos seguem o estilo dos outros cômodos, com uma decoração rústica, quadros e móveis em madeira.

Ao contrário de outras fazendas da região, a casa da Fazenda Alliança é enxuta por não ser originalmente voltada à moradia, mas sim para a produção e a venda do café. A fachada da sede abriga uma varanda de fora a fora – ótima para apreciar um cafezinho à tarde – e tem visão para a alameda de palmeiras imperiais que fica na entrada da propriedade.

Produção orgânica

É interessante notar como o passado influencia o presente na Alliança: nos tempos áureos do café, a fazenda foi reconhecida internacionalmente pela qualidade dos grãos, que eram minuciosamente escolhidos e beneficiados. Atualmente, a propriedade de 300 hectares consegue equilibrar de maneira única o legado histórico com princípios agroecológicos, nos lembrando que é possível sim ter uma relação mais generosa e sustentável com a terra.

Exemplos disso são os pioneirismos que Josefina implementou na fazenda: a Alliança foi precursora na produção de leite de búfalas no Vale do Café, as quais produzem o leite usado nos deliciosos queijos frescos e outros lácteos, e tomou a dianteira na produção de café orgânico certificado – o único na região.

Daniela Filomeno Cafe Fazenda Allianca
Daniela Filomeno peneira grãos de café da fazenda, processo importante na limpeza dos grãos (Foto: CNN Viagem & Gastronomia)

O trabalho no cafezal é como um ritual especial que remonta a um pedaço da história do Brasil. A colheita é toda feita à mão e somente os frutos maduros são retirados dos pés, que são plantados na sombra de árvores da Mata Atlântica – 43% dela está preservada nas imediações da fazenda. Assim, todo esse carinho pode ser degustado no Café Durini, que leva o sobrenome da dona e é produzido em pequenas quantidades.

E a produtividade não para por aí! Podemos ainda presenciar a criação de carneiros e a plantação de uma grande variedade de legumes, verduras e frutas que, assim como o café, são cultivados sem agrotóxicos. No total, a horta e os pomares somam mais de 100 produtos diferentes. Interessante é que a fazenda mantém o plantio e a pesquisa de PANCS (plantas alimentícias não convencionais), fazendo um resgate desta produção que nos ajuda a diversificar a alimentação – quem nunca experimentou peixinho-da-horta não sabe o que está perdendo!

Falando em sustentabilidade, a casa, inclusive, foi restaurada por Josefina a partir da reutilização de diversos materiais já existentes ali. Arquiteta por formação, ela comandou o projeto que utilizou materiais reciclados de pet, telhas de reciclado de TetraPak e bambus do próprio local.

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Iguarias frescas

iguarias produzidas na fazenda allianca
Doce de leite de búfala feito artesanalmente na Fazenda Alliança (Foto: Daniela Filomeno)

E é claro que todo esse trabalho voltado à autossustentabilidade resultaria em iguarias frescas e deliciosas com o que vem da própria terra. À tarde, nada melhor do que se sentar à mesa da cozinha e beliscar com calma um pãozinho de queijo artesanal e arrematar com um doce de leite de búfala.

Geleias, bolos, sucos… tudo é bem fresquinho e com ingredientes vindos também de produtores locais. Uma das características dessa produção é que ela também é sazonal, já que os insumos seguem o ciclo natural, mudando assim periodicamente o que é servido na fazenda.

Como parte de toda a experiência, pude colocar a mão na massa e fazer o meu próprio queijo fresco de leite de búfala – particularmente, ficou uma delícia! E que tal terminar o dia na ampla varanda desfrutando de um cafezinho especial que vem dos cafezais a poucos metros de distância?

Visitação rural

Seja por um dia ou durante a hospedagem em grupo, as atividades da Alliança são voltadas à experiência rural agroecológica. Ao lado de um funcionário, é possível fazer um passeio geral pela fazenda e conhecer as plantações, saber como é feito o café e ainda visitar o sistema histórico de beneficiamento do grão do século XIX – tudo deve ser agendado previamente. Há visitação também ao casarão e aos equipamentos centenários da tulha. É uma das poucas propriedades da região com uma boa preservação dessa herança cafeeira.

Também temos um contato mais direto com os animais, em que acompanhamos a ordenha das búfalas e a colheita das hortaliças – que podem ser preparadas ali mesmo ou ainda levadas para casa no sistema “colhe e pague”, parte do pacote da visitação. Para o grupo que se hospedar na fazenda, há ainda uma piscina para se refrescar nos dias mais quentes que fica ao lado das palmeiras imperiais, criando um cenário especial.

Daniela Filomeno deck fazenda Allianca
Daniela Filomeno no deck de madeira no pôr do sol da região montanhosa do Vale do Café (Foto: CNN Viagem&Gastronomia)

Como se não bastasse a natureza que preenche o entorno da região do Vale do Café, uma trilha de cerca de 15 minutos – que pode ser feita a pé ou de carro – leva os visitantes a um mirante de madeira com vista espetacular para a cadeia de montanhas da Serra da Concórdia. É perfeito para apreciar o pôr do sol – e para finalizar a aproximação da natureza de maneira gentil que a Alliança propõe.

Fazenda Alliança Agroecológica
Rodovia RJ 145, km 47 – divisa entre Barra do Piraí e Valença
WhatsApp: (24) 98807-6146
fazendaallianca.com.br